Fantasticamente Parcial
- Robson Oliveira
- 4 de out. de 2019
- 3 min de leitura
Ou sobre como fazer uma matéria jornalística tendenciosa!
Não sou jornalista, mas qualquer pessoa com algum conhecimento geral sabe que uma máxima do bom jornalismo é dar voz ao contraditório. É verdade que alguns meios de comunicação não têm a tradição de respeitar esse princípio, mas isso não impede que exijamos que eles sejam coerentes com seus próprios modelos de excelência e justiça. Outra coisa: é sabido que programas de televisão estão longe de serem fontes confiáveis de dados científicos, mas por causa da gravidade do tema, importa oferecer aos que desejarem uma outra perspectiva.
Recentemente, uma reportagem tendenciosa divulgou que são mais felizes e realizadas as famílias nas quais suas crianças podem escolher se desejam ser meninos e meninas. A propaganda (pois é disso que se tratava) afirmava que crianças de dois anos sentiam-se meninas em corpos de meninos e vice-versa. A base teórica do programa é que a sexualidade dos indivíduos não é natural, mas aprendida socialmente. O objetivo da matéria é mais do que explícito: encorajar crianças a serem diferentes do sexo biológico ao passo que desencorajam seus pais a imporem limites às pretensões de seus filhos, acusando-os de intolerantes e atrasados. A confiar no programa, mudar sua identidade sexual está na vanguarda de nossa sociedade e é causa de felicidade certa. O que o panfleto ideológico não disse aos telespectadores é que já houve um caso concreto em que uma criança foi objeto da atuação da ideologia de gênero. Mesmo não sendo jornalista, vou dar voz ao contraditório. Vou contar a história de David Reimer.

Desde que surgiu, em psicologia, a teoria da Neutralidade de Gênero, alguns cientistas procuraram provar a validade da tese. Em resumo, a tese diz que o gênero dos indivíduos não é natural e inato, mas aprendido e socialmente modificável. Um dos maiores defensores dessa tese foi o médico John Money, que viu nos gêmeos Bruce e Brian (1965) a oportunidade de provar a tese. Um dos irmãos, Bruce, sofreu uma cirurgia malfadada, que cauterizou seu órgão genital. Os pais dos gêmeos, preocupados com a felicidade do filho, aceitaram a oferta do psicólogo, que resolveu testar no menino a sua tese: promoveu a extração dos testículos de Bruce, mudaram seu nome para Brenda e planejaram doses frequentes de hormônio feminino para a adolescência. Ele tinha 22 meses quando isso aconteceu.
Durante 10 anos, o médico impunha terapias aos irmãos, onde fazia com que eles simulassem atos sexuais, algumas vezes obrigando-lhes a se tocarem mutuamente. Após Bruce rejeitar o tratamento de Money, que desejava construir no menino uma vagina por meio de cirurgias, o médico John Colapinto ajudou-o a retomar as rédeas de sua vida. O psicólogo Milton Diamond também testemunhou que Bruce não se identificava como menina já entre 9-11 anos. Aos 15 anos, Bruce, que era tratado por Brenda, pretende retomar sua identidade, tomando para si o nome de David.
O fim da história não parece nada com o conto de fadas do programa adocicado de domingo. O irmão de Bruce sofreu de esquizofrenia. Brian se matou em 2002. Após problemas financeiros e familiares, no dia 5 de maio de 2004 Bruce deu um tiro fatal em si mesmo. O prof. Colapinto, que entrevistou-o algumas vezes, garante que sua infância atormentada foi a verdadeira causa da sua decisão desesperada.
Essa é a história de Bruce Reimer, que virou Brenda, depois David. Que casou e teve enteados, mas que nunca conseguiu fechar as feridas que um médico charlatão causou em sua vida. Então, antes de sair por aí dizendo como seria legal ter um transgênero em sua vizinhança, como é bacana ser descolado e vanguardista, como são felizes essas famílias de Doriana da mídia, lembre-se de Bruce Reimer. Pode ser que os “causos” contados na televisão sejam só isso: “causos” para impressionar um público suscetível.
Bibliografia Sugerida:
COLAPINTO, John. What were the real reasons behind David Reimer’s suicide?
COLAPINTO, John. As Nature Made Him: The Boy Who Was Raised as A Girl?
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