Arrepios
- Robson Oliveira

- 21 de ago. de 2019
- 2 min de leitura
Acredito que a cultura na qual estamos envolvidos reflete com precisão quase cirúrgica o espírito da maioria das pessoas que se movimenta nessa cultura. Ainda que inconscientemente, os indivíduos são fortemente influenciados pelas principais ideias, pelos princípios mais relevantes que constituem cada cultura. Por essa razão, quando uma menina canta que existe paraíso na terra e faz sucesso, isso acontece porque há pessoas que acreditam na possibilidade de que, em algum sentido, possa ser encontrado o paraíso aqui, por essas esquinas: num leito cálido, num carro caro, em barco raro. O paraíso pode ser replicado aqui e agora, pensam alguns, e por isso a menina cantora faz sucesso. Outra dessas ideias é a máxima do arrepio.
A cultura na qual estamos mergulhados ensina-nos que a regra da ação deve ser as emoções: “sinta-se bem”, “fuja da dor”, “seja feliz” são as máximas de nosso tempo. Ocorre que emoções são fugazes, inconstantes, contraditórias. Alguém que obedeça a essa máxima, alguém que obedeça de verdade, terá problemas no trabalho (pois terá faltas sem motivos graves), na vida acadêmica (pois mudará de curso ao sabor das emoções), mas principalmente terá problemas em seus relacionamentos amorosos.
Algo não é dito, para quem se move por essa máxima: nossas emoções não são únicas, nem constantes. A juventude, que é impulsiva por princípio, acredita que as emoções são únicas e irrepetíveis. Canta-se até que “quando arrepia, já era”, como se a emoção agradável produzida por um beijo ou algo do gênero fosse prova definitiva e incontestável de que há algo de valor acontecendo. Erro crasso!
Arrepios, os homens temos aos borbotões! E por razões as mais diversas. É um triste engano pautar decisões relevantes sobre emoções, as quais irão se repetir, se repetir, se repetir ainda muitas vezes, durante uma vida inteira. Pior: as emoções são contraditórias. O mesmo objeto que hoje agrada, amanhã pode desagradar. Aliás, frequentemente desagrada. Basta pensar nas diversas experiências sensíveis que possuímos, nas quais a emoção agradável deu lugar ao desagrado ou ao enfado. Aquela música, que não parávamos de ouvir, hoje não conseguimos escutar. Aquele doce saboroso, hoje causa repulsa. E isso acontece porque as emoções são assim volúveis.
Não confie em arrepios, pois o que hoje se ama, amanhã se rejeitará. Por causa de sua instabilidade, os afetos não são bons conselheiros. Afinal, até um cachorro bem treinado pode oferecer-lhe uma flor e causar-lhe agrado. E há homens que muito se esforçam por assemelharem-se aos cães.









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